A todo instante estamos fazendo atividades de
adaptação, ou seja, tentativas de nos ajustarmos às mais variadas exigências,
seja do ambiente externo, seja do mundo interno, atingindo este vasto mundo de
idéias, sentimentos, desejos, expectativas, sonhos, imagens, que cada um tem
dentro de si.
Selye demonstrou, em trabalhos publicados a
partir de 1936, que o organismo quando exposto a um esforço desencadeado por um
estímulo percebido como ameaçador à homeostase, seja ele físico, químico,
biológico ou mesmo psicossocial, apresenta a tendência de responder de forma
uniforme e inespecífica, anatômica e fisiologicamente.
A esse conjunto de reações inespecíficas na
qual o organismo participa como um todo, ele chamou de Síndrome Geral de Adaptação.
Esta síndrome consiste em três fases: Reação de Alarme, Fase de Resistência e
Fase de Exaustão.
Não é necessário que a fase se desenvolva até
o final para que haja o estresse e é evidentemente só nas situações mais graves
que se atinge a última fase, a de exaustão.
A Reação de Alarme subdivide-se em dois
tempos: choque e contrachoque. Parte dessa reação assemelha-se à Reação de
Emergência de Cannon. Ele percebeu que quando um animal era submetido a
estímulos agudo ameaçadores da homeostase, inclusive medo, raiva, fome e dor, o
animal apresentava uma reação em que se preparava para a luta ou fuga. Esta
reação caracteriza-se por:
a) aumento da
freqüência cardíaca e da pressão arterial, para permitir que o sangue circule
mais rapidamente e, portanto, para chegar aos músculos esqueléticos e cérebro
mais oxigênio e nutrientes e facilite a mobilidade e o movimento;
b) contração
do baço, levando mais glóbulos vermelhos à corrente sanguínea, acarretando mais
oxigênio para o organismo particularmente nas áreas estrategicamente
favorecidas;
c) o fígado
libera glicose armazenada na corrente sanguínea para que seja utilizada como
alimento e, conseqüentemente, mais energia para os músculos e cérebro;
d)
redistribuição sanguínea, diminuindo o fluxo para a pele e vísceras, aumentando
para músculos e cérebro;
e) aumento da
freqüência respiratória e dilatação dos brônquios, para que o organismo possa
captar e receber mais oxigênio;
f) dilatação
pupilar e exoftalmia, isto é, a protuberância do olho para fora do globo ocular,
para aumentar a eficiência visual;
g) aumento do
número de linfócitos na corrente sanguínea, para reparar possíveis danos aos
tecidos por agentes externos agressores.
Tais reações são desencadeadas por descargas
adrenérgicas da medula da glândula supra-renal e de noradrenalina em fibras
pós-ganglionares do sistema nervoso autônomo simpático Em estudos realizados
com seres humanos, Funkestein descobriu que a raiva dirigida para fora estava
associada à secreção de noradrenalina, enquanto a depressão e a ansiedade
associavam-se a uma secreção de adrenalina.
Paralelamente, é acionado o eixo
hipotálamo-hipófise-supra-renal que desencadeia respostas mais lentas e
prolongadas e que desempenha um papel crucial na adaptação do organismo ao
estresse a que está sendo submetido.
O estímulo agudo provoca a secreção no
hipotálamo do hormônio "corticotrophin releasing hormone", que por
sua vez determina a liberação de ACTH da adeno-hipófise, além de outros
neuro-hormônios e peptídeos cerebrais, como as beta-endorfinas, STH, prolactina
etc.
O ACTH desencadeia a síntese e a secreção de
glicocorticóides pelo córtex da supra-renal. Estabelece-se então um mecanismo
de feedback negativo com os glicocorticóides atuando sobre o eixo
hipotálamo-hipofisário.
Estas reações são mediadas pelo sistema
diencéfalo-hipofisário, visto que não surgem em animais de experimentação que
tiveram a hipófise ou parte do diencéfalo destruídos.
Se os agentes estressantes desaparecerem, tais
reações tendem a regredir; no entanto, se o organismo é obrigado a manter seu
esforço de adaptação, entra em uma nova fase, que é chamada Fase de
Resistência, que se caracteriza basicamente pela reação de hiperatividade
córtico-supra-renal, sob mediação diencéfalo-hipofisária, com aumento
volumétrico do córtex da supra-renal, atrofia do baço e de estruturas
linfáticas, leucocitose, diminuição de eosinófilos e ulcerações.
Se os estímulos estressores continuarem a
agir, ou se tornarem crônicos e repetitivos, a resposta basicamente se mantém,
mas com duas características: diminuição da amplitude e antecipação das
respostas.
Poderá ainda haver falha nos mecanismos de
defesa, com desenvolvimento da terceira fase, que é a de Exaustão, com retorno
à Fase de Alarme de Cannon, dificuldade na manutenção de mecanismos adaptativos,
perda de reserva energética e morte.
As reações de estresse resultam, pois, de
esforços de adaptação. No entanto, se a reação ao agressor for muito intensa ou
se o agente do estresse for muito potente e/ou prolongado, poderá haver, como conseqüência,
doença ou maior predisposição ao desenvolvimento de doenças.
Pois a reação protetora sistêmica desencadeada
pelo estresse pode ir além da sua finalidade e dar lugar a efeitos
indesejáveis, devido à perda de equilíbrio geral dos tecidos e órgãos e defesa
imunológica do organismo. É oportuno lembrarmos mais uma vez Levi (1971):
"o ser humano é capaz de adaptar-se ao meio ambiente desfavorável, mas
esta adaptação não ocorre impunemente".
O perigo parece ser maior nas situações em que
a energia mobilizada pelo estresse psicoemocional não pode ser consumida.
Aliás, Seyle nos lembra que as doenças de adaptação são predominantemente conseqüências
do excesso de reações de submissão.
As colocações acima podem ser mais facilmente
comprovadas nas doenças em que notoriamente há um componente de esforço de
adaptação, como, por exemplo, nas úlceras digestivas, nas alterações da pressão
arterial, crises hemorroidicas, alterações inflamatórias do aparelho
gastrintestinal, alterações metabólicas várias etc.
O estresse pode ser físico, emocional ou
misto. O estresse misto é o mais comum, pois o estresse físico (associado a
eventos como cirurgias, traumatismos, hemorragias e lesões em geral) compromete
também o emocional já que a dor induz a estados emocionais bastante intensos.
O estresse emocional resulta de acontecimentos
que afetam o indivíduo psiquicamente ou emocionalmente, sem que haja relação
primária com lesões orgânicas. O estresse misto se estabelece quando uma lesão
física é acompanhada de comprometimento psíquico (emocional) ou vice-versa.
Öhman, Esteves e Parra (1995) apontam três
categorias de acontecimentos estressantes. Na primeira categoria encontram-se
aqueles que impõem grandes exigências à capacidade de enfrentamento de uma
pessoa e ocorrem com pouca freqüência, como por exemplo, a morte de um ente
querido, a perda de um emprego, ser aprisionado etc.
Os pequenos acontecimentos estressantes,
chamados de problemas do cotidiano constituem a segunda categoria e acontecem
com maior freqüência na vida das pessoas. Na terceira categoria encontram-se os
conflitos contínuos da vida: problemas de casais, desemprego prolongado, dificuldade
de educar os filhos, etc.
Entretanto, as pessoas diferem quanto à sua
forma de reagir aos desafios impostos pela vida. Enquanto algumas são capazes
de superar uma perda altamente significativa, outros podem dar início a um
transtorno psiquiátrico diante de um acontecimento estressante de menor
gravidade. Assim, as variáveis individuais desempenham um papel decisivo na
formação de um problema psicopatológico.
Além dos acontecimentos estressantes da vida,
Barlow (1993) sugere a existência de uma vulnerabilidade biológica e uma
vulnerabilidade psicológica necessárias para a formação de um transtorno de
ansiedade.
A vulnerabilidade biológica refere-se a uma
tendência herdada a manifestar ansiedade. Algumas pessoas reagem com uma
ativação fisiológica maior aos acontecimentos estressantes.
Mas essa resposta fisiológica é pouco
específica, não determina por si só, se uma pessoa desenvolverá transtorno de
ansiedade ou que tipo de transtorno de ansiedade ou que tipo de transtorno
poderá ocorrer.
A vulnerabilidade psicológica corresponde a
uma percepção de imprevisibilidade em relação ao mundo, que é aprendida, a
partir da relação familiar e das experiências de vida.
Assim, se uma pessoa
possui o componente biológico e desenvolve o componente psicológico, ela estará
predisposta a sofrer de um transtorno de ansiedade, a partir do momento em que
surgirem os acontecimentos estressantes da vida, os quais funcionam com o
estímulo disparador que conduz a um transtorno de ansiedade.